Em 18 de agosto de 1972, na igreja matriz de Piracuruca houve a instalação da vila de São João, em território desmembrado do termo da cidade.Contudo, a vila já aparece assinalada na Carta Geográfica de 1761.
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Para sede foi escolhido um lugarejo de quatro fogos denominado Testa Branca. O primeiro ato do governador João Pereira Caldas para a nova vila foi mandar levantar o símbolo do absolutismo português: o pelourinho. Apesar dos esforços do governador como um plano para regular o arruamento da vila essa não progrediu, com a sede sendo transferida para o Porto das Barcas. Na época o Porto das Barcas já era uma feitoria com estabelecimentos de charqueada, com intenso movimento de exportação para o sul e norte do Brasil.
Em 16 de agosto de 1844 foi elevada à categoria de cidade. Está situada na Zona Fisiográfica do Litoral, à margem direita do Rio Iagaraçu. A planta e a vista da vila de São João da Parnaíba em 1809, mandada tirar pelo governador Carlos César Burlamáqui, apresenta um traçado ortogonal muito próximo da situação atual, inclusive com as inclinações das ruas Conde D’Eu e Duque de Caxias.
Nesses dois documentos distingue-se nitidamente a Praça da Graça como logradouro central da vila e as ruas adjacentes. Entre os prédios são também facilmente identificados a Matriz de Nossa Senhora das Graças, a Igreja de Nossa Senhora do Rosário, a capela do Senhor dos Passos, o sobrado de Simplício de Dias e o sobrado da Rua Duque de Caxias nº 614 com seu mirante e detalhes do peitoril interno, aparentemente de treliçado.Entre as ruas Darcy Araújo, Marques do Herval e Alm. Gervásio Sampaio não há indicação de quadra, mas de um pátio aberto tendo no centro possivelmente o que seria um pelourinho.
Além desses prédios são assinalados vários outros sobrados e casas térreas indicando um forte adensamento no entorno da Matriz. Essa malha ortogonal revela que a vila de São João da Parnaíba teve um crescimento ordenado, servindo de diretriz para a malha de expansão urbana. No princípio do século os terrenos já apresentavam grande largura o que permitiu as implantações das casas com afastamentos laterais, mais evidentes nas quadras afastadas do núcleo antigo.
Entre o rio e a ferrovia, concentra-se o acervo de interesse de preservação. As construções mais antigas serão do século XIX e situam-se na região do Porto das Barcas e Praça da Graça. Contudo, a julgar pela planta de 1809 é possível que alguns desses prédios já existissem no final do século XVIII, visto que nove anos seriam relativamente curtos para a construção de todo esse conjunto. Entre eles sobressaem-se as instalações do Porto; na Av. Presidente Getúlio Vargas o conjunto de casas adjacente à ponte, o sobrado de azulejos, a casa do cartório, o sobrado dos Clark e o sobradão ou Casa Grande dos Dias; na Rua Duque de Caxias a meia morada de azulejos, o sobrado de mirante e a Capelo do Senhor dos Passos; entre outras. Fora as instalações do Porto das Barcas, as demais apresentam semelhanças com a arquitetura oitocentista maranhense. Azulejos de manufatura portuguesa, grades de ferro forjado e bacias de lioz conferem o vínculo com a Metrópole lusitana.
Esses prédios apresentam implantação sobre o alinhamento e limites laterais dos lotes, simetria no risco das fachadas, partidos “L”, “C” ou retangular. Os cômodos principais sempre ficam à frente, comunicando-se diretamente entre si e ladeando o corredor central ou lateral, elemento típico dessas casas. Quase sempre, dividido com arco, às vezes provido de cancela de madeira recortada. A varanda interna, entre os aposentos da frente e os dos fundos não é constante. O mesmo acontece com o correr de acesso à cozinha.
Nos sistemas construtivos predomina a alvenaria de tijolo, adobe e pedra. A carnaúba está presente nas coberturas fazendo a principal distinção com o sistema maranhense onde é totalmente ausente. Os panos de telhado seguem a tipologia tradicional .A telha artesanal de ½ cana é constante. Os telhados da casa térrea têm em média 5 metros na cumeeira e os beirais internos em torno de 2,5 metros. Esses geralmente são providos de cachorros. Externamente predomina a cimalha e bica de massa. A beira-seveira comum em todo o litoral brasileiro e mesmo no interior do Estado, é rara, mas, possivelmente frequente no passado. Não encontramos dupla-bica comum no Maranhão. A platibanda com relevos decorativos foi incorporada no princípio do século, com o advento do ecletismo. A telha vã ocorre nos cômodos secundários e a saia-e-camisa nos aposentos nobres. Também são encontrados espinhados formando desenhos geométricos, às vezes compondo quadros com os tabuados corridos.
Nos vãos predomina a verga de arco pleno, ocorrendo também o arco abatido, a verga reta e a ogiva, ou mais propriamente o arco quebrado. Os enquadramentos são de madeira e as molduras de alvenaria. Algumas janelas baixas são providas de tapa vistas constituídas de painéis de tábua corrida ou de venezianas, para evitar a visão dos interiores. As vedações originais das portas são de calha. Nas janelas são freqüentes as venezianas e calhas. Entre os elementos de vedação destacam-se as esquadrias do sobrado dos Clark e os postigos do sobrado dos Dias.
No revestimento dos pisos são encontrados assoalhos de tabuado claro-escuro, o tabuado corrido, o ladrilho de barro cozido, lajeados e ladrilho hidráulico. Os passeios são fartamente revestidos de “pedra de jacaré”.
Há indícios de que esse conjunto teria sido bem maior, substituído progressivamente por novos padrões no princípio do século, em função do desenvolvimento do comércio de exportação e importação que alcançou seu apogeu durante a 2ª Grande Guerra, acentuando-se mais recentemente em função de novo surto desenvolvimentista.
O fator mercantilista foi determinante na configuração urbanística desse núcleo. O ecletismo se instalou na primeira metade do século, em decorrência das relações de produção e consumo. A av. Presidente Getúlio Vargas, artéria de ligação entre o Porto e a Estação Ferroviária, é a essência desse segundo momento urbanístico, planejada no redimensionamento de padrões e indicando o gosto estético de então. Esse logradouro reflete bem a evolução da arquitetura urbana de Parnaíba. Na extremidade junto ao Rio Igaraçú, a referência original mesclada no engenho e arte lusitanos das alvenarias de pedra e cal de sarnambi, faiança e ferro forjado, com a carnaúba e a telha vã na conveniência do clima equatorial. A harmonia desse conjunto foi drasticamente quebrada com a inserção da ponte sobre o Igaraçú.
Na oposta o fim do trabalho escravo, a arquitetura ferroviária da década de 40, como expressão de um novo tempo. No entremeio a linguagem ornamental e romântica dos chalés, bangalôs, casas de porão alto e pó de pedra, ancorada em receitas formais de inspiração inglesa, conferindo nova fisionomia urbana. Nessa paisagem, onde o Porto foi o contato com a sociedade européia e a ferrovia o mais forte sinal de interiorização, além da navegação fluvial, o edifício da União Caixeiral sobressai-se como símbolo de uma nova mentalidade empresarial.
À esquerda desse eixo, praticamente nada se construiu no século passado por se tratar de área sujeita à inundações. No flanco oposto a cidade também se desenvolveu baseada nos padrões ecléticos, notadamente no entorno da praça de Santo Antônio.
Além da Estação, a síntese temática dos esquemas estrangeiros de meados do século expressa no “castelinho” de ameias e torreão, de domínio sobre a paisagem.
As mudanças sócio-econômicas e tecnológicas roporcionam transformações nos modos de habitar e construir, incorporando benefícios da sociedade industrial. Nesse contexto o ecletismo foi a solução formal para atender os objetivos arquitetônicos. Com nova implantação a arquitetura é associada então aos jardins laterais nos afastamentos frontal e laterais. As residências, e mesmo sobrados comerciais, são elaboradas como palacetes buscando transmitir a posição social dos proprietários. Fachadas rebuscadas, gradis de ferro fundido, estucarias, vidraças, azulejaria, louças e metais, bandeiras e lambrequins recortados em serra de fita, pastilhas, ladrilho hidráulico e telha plana são os produtos da mecanização e do trabalho assalariado, associados às alterações técnicas construtivas. Nesse cenário sobressai-se a casa de porão alto com águas retas e sem galbo correndo para as laterais ao contrário das coloniais. Nos sobrados o andar superior foi destinado à parte íntima da família e o térreo para salas, refeições e serviço. Curiosamente, não encontramos em Parnaíba nem as cúpulas de alvenaria nem os revestimentos marmorizados que em Piracuruca destacam-se na paisagem local, senão nos enquadramentos dos arcos internos da Matriz de Nossa Senhora da Graça, mas sem a texturização do mármore.
A adoção do Art Deco no repertório eclético, preferencialmente em edifícios comerciais, cinemas e prédios e monumentos públicos, incorporou novas tecnologias do concreto armado, superfícies cristalizadas, estruturas de vidro e geometrismo ordenador, conferindo um ar de modernidade para uma classe cosmopolita que não se identificava com o colonial. Com a força, elegância e funcionalidade de um desing aberto, a abstração do Art Deco estendeu-se além da arquitetura ornamentando luminárias e mobiliário, com notáveis exemplos ainda encontrados na cidade.
Das construções religiosas, a informação mais antiga vem de Pereira da Costa que relata a existência na então vila de São João da Parnaíba de uma pequena ermida erigida pelos moradores. Provavelmente tosca e provisória, pois, nada mais sabe-se a seu respeito. A paróquia sob a invocação de Nossa Senhora das Graças foi criada em 1805. Já a construção do templo, conforme inscrição no frontão, dá o ano de 1770 como início das obras e como término o de 1936. A Igreja aparece representada na planta de 1809, com as suas duas torres sineiras. O edifício incorporou elementos típicos do século XIX, destacando-se as portadas, arcarias, pia batismal, enquadramentos e sobrevergas talhados em lioz português. Exceção às arcadas da capela do Santíssimo, as demais, inclusive o arco cruzeiro, mostram acabamento de massa fina imitando o lioz, revelando a descontinuidade na construção do templo. Entre os elementos de arte aplicada destacam-se os silhares de azulejos que paramentam a capela do Santíssimo; o retábulo do altar-mor, com a belíssima imagem de Nossa Senhora do Leite; e o retábulo e os cancelões de ferro forjado da capela do Santíssimo. As portas almofadadas e de calha correspondem aos padrões adotados no século passado, inclusive as dobradiças e espelhos de fechadura em ferro forjado. Pinturas no forro da capela-mor e no fundo altar da capela do lado da Epístola denunciam a intenção ornamental cuja qualidade depende de estudos especializados para sua aferição. Implantada em quadra residencial, é a principal referência da arquitetura religiosa de Parnaíba. Bastante descaracterizada com sucessivas reformas, a leitura arquitetônica torna-se cada vez mais comprometida.
A Igreja de Nossa Senhora do Rosário conforme exposto acima, já existia em 1809. É possível que já existisse no final do século XVIII, porém com outra fisionomia. Ao contrário da Matriz de Nossa Senhora das Graças, que já em 1809 dividia a quadra com o sobradão dos Dias, a Igreja do Rosário aparece na planta supra citada ligeiramente afastada de uma casa térrea, sem que se possa afirmar tratar-se de implantação em quadra comum ou isolada. As vergas ogivais, abatidas e de arco pleno refletem o espírito eclético acentuado no interior, especialmente na capela-mor e laterais.
A capela dos Passos da Paixão também é registrada na planta de 1809, mas com frontão triangular e não com a platibanda atual. Atualmente exibe um letreiro com o seguinte dizer: “A mais antiga do Norte do Piauí – 1711”. Certamente não se trata do templo atual e, face as dimensões e localização, é estranha a existência desse pequeno oratório, meio século antes da instalação da vila de São João da Parnaíba. Em todo caso é curioso que apenas uma capela dos Passos tenha sido registrada na planta de 1809, quando o normal são cinco.
A Igreja e Convento de Santo Antônio corresponde aos padrões deste princípio de século com torre única sobre pórtico central e avançado, variedade de vãos, relevos e ornatos decorativos, além de situada em local afastado do núcleo antigo.
Sobre os prédios públicos a referência mais antiga é da construção da casa da câmara e cadeia em 1775, na então vila de São João da Parnaíba. Na planta e na vista de 1809 a casa da câmara e cadeia não é legível. A possível confirmação do pelourinho acima citado remete o local como endereço da mesma, mas tratando-se de uma praça secundária e considerando-se a simplicidade das casas ali assinaladas seria pouco provável essa situação. Por outro lado, aos fundos do sobrado de mirante eleva-se um curioso mastro com travessa e escora na extremidade, dando a entender tratar-se de uma forca (il. da capa). Embora isso não estabeleça relação do sobrado com a casa da câmara e cadeia, é um importante elemento para investigação. Por analogia com as casas de câmara e cadeia do Maranhão, de tipologia praticamente igual a da casa de moradia, o sobrado apresenta compatibilidade funcional. Apesar da pouco desempenho gráfico do cartógrafo Pedro Cezar de Menezes, autor da carta de 1809, acresce destacar no desenho as tacaniças laterais e não as empenas atuais, denunciando um provável isolamento do prédio em relação aos vizinhos. Conjectura-se também de que a Igreja de Nossa Senhora do Rosário seja posterior a esse sobrado e que a praça da Graça se estendesse até ele, deixando-o voltado para a dita praça. Não obstante, isso tirasse o formato quadrado do logradouro, que nos parece mais condizente com o perfil ortogonal. Ainda assim o pelourinho ficaria isolado noutra praça.
Entre os novos prédios oficiais destacam-se o da União Caixeiral; a Unidade Escolar Miranda Osório; o Mercado Público Municipal; e a Estação Ferroviária, juntamente com os prédios do Almoxarifado, Escritório, Armazém e Corpo de Bombeiros que integram o acervo da Estrada de Ferro Central do Piauí. São todas construções da primeira metade do século. Os prédios da Estação, da Unidade Escolar Miranda Osório e o Mercado Público obedecem a projetos padronizados difundidos pelos órgãos oficiais. A União Caixeiral enquadra-se entre as principais manifestações ecléticas e os demais, em nítida concepção Déco, representam o final de um ciclo de prosperidade.
Na categoria dos equipamentos urbanos destacamos o monumento comemorativo à Independência do Piauí, localizado na praça da Graça e o monumento comemorativo ao Primeiro Centenário de Parnaíba, localizado na praça de Santo Antônio. Ambos em pó-de-pedra cristalizam a força de expressão, proporção, simplicidade, serenidade e bom gosto do Art Deco. Outro componente que merece destaque pelo significado histórico são as Docas junto ao Porto das Barcas.
O estado físico de modo geral é satisfatório e as descaracterizações em boa parte são passíveis de reversibilidade. Como nas outras cidades estudadas, as infiltrações de águas pluviais representam uma das principais causas de deterioração. Nos períodos de chuvas percebe-se intensa umidade nas alvenarias e pisos.
Quanto ao uso não se diagnosticou maiores incompatibilidades. Porém, a forma como alguns imóveis são tratados revela que o acervo arquitetônico e urbanístico não tem recebido os cuidados merecidos. Não há sinais de abandono nem de arruinamento e a falta de uso nos imóveis fechados é apenas uma estratégia de valorização imobiliária, visto que todo esse setor urbano é o principal pólo comercial e administrativo da cidade. Por outro lado, muitas casa já perderam a função residencial de origem cedendo lugar para clínicas médicas, escritórios, lojas e serviços. Atualmente são vistas em alguns imóveis placas de locação e venda. Em alguns contatos com moradores dessas casas nos foi passado também a intenção de venda dos mesmos. Essa substituição de função revela a desvalorização do núcleo antigo como local de moradia. Com isso, as adaptações funcionais em geral se realizam sem nenhuma preocupação com preservação da memória arquitetônica. A eliminação sumária de casas antigas para dar lugar a novos prédios vem se acentuando com rapidez. O tecido urbano tradicional apresenta-se bastante fragmentado em decorrência dos novos empreendimentos, não se podendo mais determinar um conjunto de perímetro contínuo, frente as alterações ocorridas em grandes áreas desse núcleo.
Em Parnaíba foram objeto de estudo as estruturas arquitetônicas e urbanísticas na sede do Município, tendo sido registrados 105 imóveis da categoria civil, 10 da categoria oficial, 4 da categoria 4 religiosa e 3 da categoria equipamentos urbanos, conforme fichas a arruamentos, ou apenas de interesse histórico como é o caso da Casa de Humberto de Campos. Alguns desses imóveis não apresentam maior valor arquitetônico tendo sido incluídos no cadastramento como elementos de interesse na composição dos arruamentos, ou apenas de interesse histórico como é o caso da Casa de Humberto de Campos.